A leitura para além da decodificação
SILVIA DE MATTOS GASPARIAN COLELLO (FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA USP).
Resumo
Quase trinta anos já se passaram desde que Paulo Freire proferiu a frase que, pelo seu teor fundamental, tornou–se célebre entre os estudiosos da linguagem: “A leitura de mundo precede a leitura da palavra e a leitura desta implica a continuidade da leitura daquele.” (COLE, 1981). Não obstante, a língua escrita prevalece na escola como um bem em si mesmo, um instrumental para a transmissão de conteúdos que, alheios à realidade do sujeito aprendiz, tornam–se simultaneamente alienados e alienantes, favorecendo o fracasso escolar. Tratada como código de transcrição da fala (ou de recuperação dela a partir das marcas gráficas), a escrita aparece na prática da alfabetização como processo de codificação e decodificação, procedimentos insensíveis ao contexto ou à condição dos interlocutores. Quando a leitura é concebida como o inverso da escrita, a língua é tomada como simples articulação entre fonemas e grafemas e, assim, fica mascarada a sua natureza dialógica tão bem estudada por Bakhtin. Com o propósito de favorecer a compreensão dos complexos mecanismos de leitura, o presente trabalho pretende fazer uma análise dos diferentes planos inerentes à possibilidade de se ler com autonomia. Para tanto investe na busca de textos – correntes na vida social ou mesmo literários – que, pela sua natureza, exercem diferentes apelos ao sujeito leitor: ora privilegiando o reconhecimento da língua e da dimensão fonética próprias do código, ora evidenciando o papel do gênero, da
“arquitetura” na progressão temática e a importância do contexto nas práticas de leitura. Por fim, discute as implicações pedagógicas, propondo uma reflexão sobre os mitos que, ainda hoje e com tanta freqüência, sustentam a abordagem escolar reducionista para o ensino da leitura e para o estímulo da prática leitora entre os estudantes. Palavras-chave:
Leitura,