A Historia Do Vinho
Hugh Jonnson
Companhia das Letras, 1999 pág. 202 a 204
Os Carreteiros dos Mares
Se Shakespeare tivesse escrito suas peças meio século depois, sua obra bem poderia incluir O mercador de Amsterdam e Os dois gentis-homens de Haarlem; e Romeu e Julieta talvez se entregassem ao êxtase num balcão de Leyden ou Delft - a tal ponto chegava a primazia da Holanda na primeira metade do século XVII. Foram os holandeses, mais do que os italianos, os espanhóis ou os franceses, que ensinaram à Europa os significados do poderio comercial e os traduziram em conquista cultural.
A história é espantosa, porque durante mais de um século os holandeses foram vassalos da Espanha, um simples posto avançado do vasto império espanhol, sem importância e sem recursos. Os poucos campos disponíveis não conseguiam sequer alimentar a população, que dependia dos pescadores para comer. Sob o comando de Guilherme, o Taciturno, príncipe de Orange na Provença e de Nassau na Alemanha, e de seus dois filhos, Maurício e Frederico-Henrique, as sete províncias setentrionais que hoje constituem a Holanda uniram-se para lutar contra os espanhóis e a Inquisição e expulsá-los do país.
Ao mesmo tempo, separaram-se das ricas províncias da Flandres (a futura Bélgica), mas em poderio comercial superou-as de tal modo que praticamente da noite para o dia Amsterdam tornou-se uma cidade muito mais rica do que a Antuérpia, que ao longo de um século fora o maior porto da Europa. Em 1609, os holandeses simplesmente ocuparam e fecharam a embocadura do Scheldt, o rio de Antuérpia, e bloquearam seu comércio. A riqueza e o talento das províncias meridionais transferiram-se para o Norte, passando a integrar essa nova e revolucionária sociedade, baseada na tolerância religiosa e no trabalho duro; entre 1560 e 1610, 100 mil famílias mudaram-se de Flandres para as Províncias Unidas (assim se chamava a Holanda).
Em 1650, os holandeses possuíam a maior frota mercante que o mundo já vira, com cerca de 10 mil