"A Arca Russa"
(uma crítica ao filme visto em 7 de Dezembro de 2011 na Gulbenkian)
Nos 96 minutos de exibição do filme, rodado em 2001 pelo cineasta Aleksander Sokurov, sentimentos contraditórios levaram-me do genial ao confuso, da genialidade da técnica à escassez do modo.
Trezentos anos da história russa são exibidos: do apogeu e queda dos czares, à «nova» Rússia e a
Revolução Russa, com a nova classe: o proletariado. Na exibição das cenas dessa época do imperialismo, só o espectador conhecedor consegue enquadrar os episódios que se vão desenrolando sob o seu olhar atento, decifrando as passagens que desfilam na tela. O Marquês de
Custine, guia e diplomata francês do sec. XIX, surge como um personagem algo estranho: evoca a memória histórica russa, filosofando sobre o passado e o destino russo, mas não elucida os momentos episódicos em que o mesmo é simultaneamente cúmplice e observador. Absorto nas próprias observações, maravilhado com o requinte das salas, extasiado na arte, deleitando-se nas próprias sensações contemplativas, solta ocasionalmente comentários mais incontidos. Se o desenrolar no tempo é progressivo, observa-se uma descontinuidade do filme no seu enquadramento histórico, e na respectiva ordem cronológica dos acontecimentos. As referências ao despotismo iluminado da aristocracia russa e o seu ambiente palaciano, são reservadas às considerações do Marquês de Custine, e as alusões ao fausto e à imponência da época são uma constante do realizador, no percurso das 33 salas do Museu do Hermitage, evidenciando momentos de reverência pela imponência palaciana de São Petersburgo.
Na perspectiva cinematográfica, não concluí se o filme é narrativo, dramático ou documental, e qual o seu contexto. Se é narrativo, quem é o narrador? O Marquês? Na quase totalidade do filme, enceta um monólogo no qual o espectador deduz o momento cronológico da narrativa. Será o realizador? Parece perdido no tempo e no espaço, perseguindo não se sabe