trabalho BRENDA
Se é clara a luz desta vermelha margem é porque dela se ergue uma figura nua e o silêncio é recente e todavia antigo enquanto se penteia na sombra da folhagem.
Que longe é ver tão perto o centro da frescura
e as linhas calmas e as brisas sossegadas!
O que ela pensa é só vagar, um ser só espaço que no umbigo principia e fulge em transparência.
Numa deriva imóvel, o seu hálito é o tempo que em espiral circula ao ritmo da origem.
Ela é a amante que concebe o ser no seu ouvido, na corola do vento. Osmose branca, embriaguez vertiginosa.
O seu sorriso é a distância fluida, a subtileza do ar.
Quase dorme no suave clamor e se dissipa e nasce do esquecimento como um sopro indivisível.
António Ramos Rosa, in "Volante Verde"
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Retrato de Mulher Triste
Vestiu-se para um baile que não há.
Sentou-se com suas últimas jóias.
E olha para o lado, imóvel.
Está vendo os salões que se acabaram, embala-se em valsas que não dançou, levemente sorri para um homem.
O homem que não existiu.
Se alguém lhe disser que sonha, levantará com desdém o arco das sobrancelhas,
Pois jamais se viveu com tanta plenitude.
Mas para falar de sua vida tem de abaixar as quase infantis pestanas, e esperar que se apaguem duas infinitas lágrimas.
Cecília Meireles, in 'Poemas (1942-1959)'
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A Mulher Inspiradora
Mulher, não és só obra de Deus; os homens vão-te criando eternamente com a formosura dos seus corações, e os seus anseios vestiram de glória a tua juventude.
Por ti o poeta vai tecendo a sua imaginária tela de ouro: o pintor dá às tuas formas, dia após dia, nova imortalidade.
Para te adornar, para te vestir, para tornar-te mais preciosa, o mar traz as suas pérolas, a terra o seu ouro, sua flor os jardins do Verão.
Mulher, és meio mulher, meio sonho.
Rabindranath Tagore, in "O Coração da Primavera"
Tradução de Manuel Simões
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