TICA E INTERESSE PR PRIO
Subsistem dúvidas pessoais acerca da ética. Viver eticamente, supomos, será duro e desconfortável, envolverá sacrifício próprio e, em termos gerais, não será compensador. Vemos a ética como contrapondo-se ao interesse próprio: pressupomos que aqueles que fazem fortuna recorrendo a informações internas ignoram a ética, mas são bem sucedidos na satisfação dos seus interesses (desde que não sejam apanhados). Nós próprios fazemos o mesmo, ao aceitar um emprego no qual a remuneração é superior à de outro, mesmo significando isso que estamos a ajudar a fabricar ou promover um produto que não faz qualquer bem ou, na verdade, faz adoecer as pessoas. Por outro lado, considera-se que quem recusa oportunidades de subir na carreira devido a «escrúpulos» éticos sobre a natureza do seu trabalho, ou quem doa a sua riqueza a boas causas, está a sacrificar os seus interesses próprios de forma a obedecer aos ditames da ética. Ainda pior, podemos considerá-los palermas, desperdiçando todas as coisas boas de que poderiam usufruir, enquanto outros se aproveitam da sua generosidade inútil. Esta ortodoxia corrente acerca do interesse próprio e da ética traça um quadro da ética como algo externo a nós, hostil mesmo aos nossos próprios interesses. Vemo-nos constantemente divididos entre o impulso de contribuir para o nosso interesse próprio e o receio de sermos apanhados a fazer algo que os outros condenarão, e pelo qual seremos punidos. Este quadro está arraigado em muitos dos mais influentes modos de pensar na nossa cultura. Encontra-se nas ideias religiosas tradicionais que prometem recompensas ou ameaçam castigos para o bom e o mau comportamento, mas remetem a recompensa ou o castigo para outro reino e, assim, tornam-no externo a este mundo. Encontra-se também na ideia de que os seres humanos se situam no ponto intermédio entre o céu e a terra, partilhando o reino espiritual dos anjos ao mesmo tempo que estão aprisionados pela sua natureza corporalmente