Suspeitas na história
A história só é história na medida em que não consente nem no discurso absoluto, nem na singularidade absoluta, na medida em que o seu sentido se mantém confuso, misturado. A história é essencialmente equívoca, no sentido de que é virtualmente fatual (se baseia nos fatos) e virtualmente estrutural. Nem a história das estruturas conta tudo, e nem a história dos episódios ou dos grandes feitos. Para fazer a história total é preciso entender ambas. E para isso levantar suspeitas.
Primeiro: Suspeita do Poder - o objetivo é sempre um elemento de poder, o exercício da autoridade formalizada pelo direito. E nada mais próximo do conservadorismo do que a autoridade. Mas nada mais próximo da versão ideológica militante do que a luta pela derrubada de um regime ou de uma autoridade.
Segundo: Suspeita do Romantismo - a história do Direito foi, contudo uma história romântica. Pegamos apenas dois exemplos, um foi Savigny, um homem que no seu tempo tentou fazer do direito romano um sistema que auxiliasse sua tarefa de jurista, com o propósito de combater as pretensões dos legisladores alemães. E ainda rejeitava a um só tempo o afrancesamento do direito dos povos de língua alemã e a elevação da lei ao caráter de fonte primária do direito. Em seu lugar acreditava que deveria contar o espírito do povo. Mas como o povo não pode falar por si, ou quando fala é incompreensível porque se multiplicam os pontos de vista, então caberia aos professores falarem em nome do povo. O outro exemplo foi a escola histórica, que foi seguramente uma história econômica e social e não foi tampouco sociológica ou jusnaturalista. Também foi antes de tudo nacionalista e tradicional.
Terceiro: Suspeita das Continuidades – “O tempo verdadeiro é por sua própria natureza um contínuo. È também mudança perpétua”, dizia Marc Block. Para escapar de uma história legitimadora do status quo é indispensável pensar que fomos precedidos por gerações diferentes de nós e seremos sucedidos