Sobre o poder global
JOSÉ LUÍS FIORI
“A mera preservação da existência social exige, na livre competição, uma expansão constante. Quem não sobe cai. E a expansão significa o domínio sobre os mais próximos e sua redução ao estado de dependência [...] Em termos muito rigorosos, o que temos é um mecanismo social muito simples que, uma vez posto em movimento, funciona com a regularidade de um relógio .”
Norbert Elias, Processo Civilizador, pg 94
1. HEGEMONIAS, REGIMES E GOVERNANÇAS INTERNACIONAIS
Foi no início da década de 1970, que Charles Kindelberger e Robert Gilpin formularam a tese fundamental que depois se chamou de “teoria da estabilidade hegemônica”. O mundo enfrentava as primeiras manifestações da crise internacional que seguiu o fim do Sistema de Bretton Woods e a derrota dos Estados Unidos no Vietnã, e os dois autores estavam preocupados com a possibilidade que se repetisse a crise e a Grande Depressão dos anos 30, por falta de uma liderança mundial. Foi quando Kindelberger afirmou que o bom funcionamento de "uma economia liberal mundial, necessita de um estabilizador e um só país estabilizador" (idem, 1973, pg 304) Um país que assumisse a responsabilidade e provesse o sistema mundial de alguns “bens públicos” indispensáveis para o seu funcionamento, como é o caso de uma moeda internacional e do livre-comércio, ou da coordenação das políticas econômicas nacionais e da promoção de políticas anti-cíclicas de eficácia global. A tese de Kindelberger tinha uma natureza claramente normativa, mas se apoiava numa leitura teórica e comparativa da história do sistema capitalista. Como sintetizou Robert Gilpin: “a experiência histórica sugere que, na ausência de uma potência liberal dominante, a cooperação econômica internacional mostrou-se extremamente difícil de ser alcançada ou mantida...” (1988, p:88) Kindelberger falou inicialmente numa “liderança” ou “primazia”, mas depois, um número cada vez maior de autores passou a utilizar o conceito