sob o medo do mundo feudal
Igreja e nobreza comandam o nascimento de nações. Camponeses sofrem com fome, epidemias e violência. Eis o pano de fundo da Europa medieval
Maurício Bonas | 01/11/2005 00h00
Para compreender uma era, talvez não exista termômetro mais preciso que a forma como viveram nela as pessoas – o que as angustiava ou confortava, como imaginavam o futuro e o que sonhavam alcançar. Em alguns momentos da história, porém, parece que nada faz sentido. Ver a Idade Média européia com olhos contemporâneos dá bem essa impressão. A expectativa de vida era baixa – raros os que alcançavam 60 anos –, um pote de mel valia mais que um escravo e um par de palavras mal aplicadas levava ao gesto bem comum: a mão num átimo voando à faca ou à espada pendente na cintura. Quando a organizada sociedade da Roma imperial ruiu, substituída por reinos germânicos incivilizados, a violência explodiu e se tornou uma das poucas moedas presentes em todas as sociedades da Europa ocidental. Em um primeiro momento, a sustentação básica medieval, formada pela tríade Igreja, nobreza e campesinato, pouco oferecia em organização.
Mesmo os franco-germanos, que a partir das dinastias merovíngia e carolíngia conseguiram o mínimo de reorganização do continente, consideravam natural essa lógica baseada na agressividade em seu viés mais selvagem. “Os francos só conseguiram vencer o Império Romano cultivando incessantemente as virtudes militares”, dizem os historiadores franceses Philippe Ariès e Georges Duby no primeiro volume de A História da Vida Privada. “Em 793, durante um ataque muçulmano contra Conques, um jovem aristocrata preferiu conservar sua montaria a trocá-la por sua mãe prisioneira”, contam eles, acrescentando que a mulher foi trucidada em frente do filho. Se há uma lógica na Alta Idade Média, ela está nesta combinação: o cavalo e a espada valiam mais que a vida de uma única pessoa, já que, com ajuda dessa dupla, o homem combatia, se mantinha vivo e protegia outras vidas.