Psicanalise: leituras de lacan
O romancista, dramaturgo e poeta português José Saramago é autor de diversas obras, mas em uma delas, denominada “Ensaio sobre a Cegueira”, o autor instiga o leitor a “olhar a visão” e, para tal tarefa, é preciso fechar os olhos, pois a visão não poderia julgar a si mesma. O autor começa o livro com uma imagem ordinária: a cidade barulhenta, trânsito pesado, pessoas disputando, a cada passo, um lugar na rua. Mas algo incomum acontece com um dos carros parados no semáforo: “[...] logo se notou que não tinham arrancado todos por igual. O primeiro da fila está parado [...]”. (p. 11). Um morador destas megalópoles estranharia esta cena, pois todos estão sempre apresados, adivinhando o momento do sinal verde para sair em disparada: “[...] deve ser um problema mecânico qualquer, o acelerador solto [...]”. (p. 11). Nada disso. O motorista abre a porta e diz: “Estou cego”. (p. 11). Desesperado, em prantos, o primeiro cego grita a mortalidade dos olhos. “[...] quem me diria, quando saí de casa esta manhã, que estava para me acontecer uma fatalidade como esta.” (p. 13). A possibilidade da desgraça é sempre um fato na vida do outro, desde que este outro não seja “eu”. Foi assim que aconteceu o primeiro caso de cegueira dos muitos que haveriam de surgir.
Gradativamente uma espécie de mancha branca ocular (Cf. p. 11) espalhava-se de maneira tão acentuada que o caso poderia tornar-se uma “[...] catástrofe nacional [...]”. (p. 37). Eis o enredo da obra: efetivamente, a catástrofe atingiu proporções nacionais! Diante disso, além de descrever como o Estado em nome da humanidade pode tornar-se desumano, colocando tais discursos demasiadamente humanistas sobre suspeita, Saramago constrói uma antropologia do mal pelos personagens: “É desta massa que nós fomos feitos, metade indiferença e metade de ruindade”. (p. 40). O homem tem em sua estrutura o mal e, para acompanhar isso, o autor cria uma personagem que funcionaria como espiã