Poesia Machado De Assis
Texto-fonte:
Obra Completa, Machado de Assis, vol. III,
Nova Aguilar, Rio de Janeiro, 1994.
Publicado originalmente em Poesias Completas, Rio de Janeiro: Garnier, 1901.
ÍNDICE
O DESFECHO
CÍRCULO VICIOSO
UMA CRIATURA
A ARTUR DE OLIVEIRA, ENFERMO
MUNDO INTERIOR
O CORVO
PERGUNTAS SEM RESPOSTA
TO BE OR NOT TO BE
LINDÓIA
SUAVE MARI MAGNO
A MOSCA AZUL
ANTONIO JOSÉ
ESPINOSA
GONÇALVES CRESPO
ALENCAR
CAMÕES
JOSÉ DE ANCHIETA
SONETO DE NATAL
OS ANIMAIS ISCADOS DA PESTE
DANTE
A FELÍCIO DOS SANTOS
MARIA
A UMA SENHORA QUE ME PEDIU VERSOS
CLÓDIA
NO ALTO
O DESFECHO
Prometeu sacudiu os braços manietados
E súplice pediu a eterna compaixão,
Ao ver o desfilar dos séculos que vão
Pausadamente, como um dobre de finados.
Mais dez, mais cem, mais mil e mais um bilião,
Uns cingidos de luz, outros ensangüentados...
Súbito, sacudindo as asas de tufão,
Fita-lhe a água em cima os olhos espantados.
Pela primeira vez a víscera do herói,
Que a imensa ave do céu perpetuamente rói,
Deixou de renascer às raivas que a consomem.
Uma invisível mão as cadeias dilui;
Frio, inerte, ao abismo um corpo morto rui;
Acabara o suplício e acabara o homem.
CÍRCULO VICIOSO
Bailando no ar, gemia inquieto vaga-lume:
— "Quem me dera que fosse aquela loura estrela,
Que arde no eterno azul, como uma eterna vela!"
Mas a estrela, fitando a lua, com ciúme:
— "Pudesse eu copiar o transparente lume,
Que, da grega coluna à gótica janela,
Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela!"
Mas a lua, fitando o sol, com azedume:
— "Mísera! tivesse eu aquela enorme, àquela
Claridade imortal, que toda a luz resume!"
Mas o sol, inclinando a rútila capela:
— "Pesa-me esta brilhante auréola de nume...
Enfara-me esta azul e desmedida umbela...
Por que não nasci eu um simples vaga-lume?"