Os Símbolos Da Ausência
O animal é seu corpo. Sua programação biológica é completa, fechada, perfeita. Não há problemas não respondidos.
A cultura, nome que se dá a esses mundos que os homens imaginam e constroem só se inicia no momento em que o corpo deixa de dar ordens.
Grandes e pequenos se dão as mãos e brincam de roda, empinam papagaios, dançam... E choram seus mortos, e choram a si mesmos em seus mortos, e constroem altares, e falam sobre a suprema conquista do corpo, o triunfo final sobre a natureza, a imortalidade da alma, a ressurreição da carne.
Canções fúnebres exorcizarão a morte? Parece que não. Mas elas exorcizam o terror e lançam pelos espaços afora o gemido de protesto e a reticência de esperança. E os poemas do cativeiro não quebram as correntes nem abrem as portas mas, por razões que não entendemos bem, parece que os homens se alimentam deles e, no fio tênue da fala que os enuncia, surge de novo a voz do protesto e o brilho da esperança.
A realização da intenção da cultura se transfere então para a esfera dos símbolos. Teia de símbolos, rede de desejos, confissão da espera, horizonte dos horizontes, a mais fantástica e pretensiosa tentativa de transubstanciar a natureza. Para a religião, não importam os fatos e as presenças que os sentidos podem agarrar. Importam os objetos que a fantasia e a imaginação podem construir.
A religião nasce com o poder que os homens têm de dar nomes às coisas, fazendo uma discriminação entre coisas de importância secundária e coisas nas quais seu destino, sua vida e sua morte se dependuram. Esta é a razão por que, fazendo uma abstração dos sentimentos e experiências pessoais que acompanham o encontro com o sagrado, a religião se nos apresenta como certo tipo de fala, um discurso, uma rede de símbolos.
Há verdades que são frias e inertes. Nelas não se dependura nosso destino. Quando, ao contrário, tocamos nos símbolos em que nos dependuramos, o corpo inteiro estremece. E esse estremecer é a marca emocional/existencial