No manantial (Literatura)
— Está vendo aquele umbu, lá embaixo, à direita do coxilhão?
Pois ali é a tapera do Mariano. Nunca vi pêssegos mais bonitos que os que amadurecem naquele abandono; ainda hoje os marmeleiros carregam, que é uma temeridade!
Mais para baixo, como umas três quadras, há uns olhos-d’água, minando as pedras, e logo adiante uns coqueiros; depois pega um cordão de araçazeiros.
Diziam os antigos que ali encostado havia um lagoão mui fundo onde até jacaré se criava.
Eu, desde guri conheci o lagoão já tapado pelos capins, mas o lugar sempre respeitado como um tremedal perigoso: até contavam de um mascate que aí atolou-se e sumiu-se com duas mulas cargueiras e canastras e tudo...
Mais de uma rês magra ajudei a tirar de lá; iam à grama verde e atolavam-se logo, até a papada. Só cruzam ali por cima as perdizes e algum cusco leviano.
Com certeza que as raízes do pasto e dos aguapés foram trançando uma enrediça fechada, e o barro e as folhas mortas foram-se amontoando e, pouco a pouco, capeando, fazendo a tampa do sumidouro.
E depois nunca deram desgoto na ponta do lagoão, porque, se dessem, a água corria e não se formaria o mundéu…
Mas, onde quero chegar: vou mostrar-lhe, lá, bem no meio do manantial, uma cousa que vancê nunca pensou ver; é uma roseira, e sempre carregada de rosas...
Gente vivente não apanha as flores porque quem plantou a roseira foi um defunto... e era até agouro um cristão enfeitar-se com uma rosa daquelas!...
Mas, mesmo ninguém poderia lá chegar; o manantial defende a roseira baguala: mal um firma o pé na beirada, tudo aquilo treme e bufa e borbulha...
Uns carreteiros que acamparam na tapera do Mariano contaram que pela volta da meia-noite viram sobre o manantial duas almas, uma, vestida de branco, outra, de mais escuro.., e ouviram uma voz que chorava um choro mui suspirado e outra que soltava barbaridades...
Mas como era longe e eles estavam de cabelos em pé... — pois nem os cachorros acuavam, só uivavam... uivavam...— não