narciso como narcose
O mito grego de Narciso está diretamente ligado a um fato da experiência humana, como a própria palavra Narciso indica. Ela vem da palavra grega narcosis, entorpecimento. O jovem Narciso tomou seu próprio reflexo na água por outra pessoa. A extensão de si mesmo pelo espelho embotou suas percepções até que ele se tornou o servomecanismo de sua própria imagem prolongada ou repetida. A ninfa Eco tentou conquistar seu amor por meio de fragmentos de sua própria fala, mas em vão. Ele estava sonado. Havia-se adaptado à extensão de si mesmo e tornara-se um sistema fechado.
O que importa neste mito é o fato de que os homens logo se tornam fascinados por qualquer extensão de si mesmas em qualquer material que não seja o deles próprios. Tem havido cínicos que insistem em que os homens se apaixonam profundamente por mulheres que reflitam sua própria imagem. Seja como for, a sabedoria do mito de Narciso de nenhum modo indica que ele se tenha enamorado de algo que ele tenha considerado como sua própria pessoa. É claro que seus sentimentos a respeito da imagem refletida teriam sido bem diferentes, soubesse ele que se tratava de uma extensão ou repetição de si mesmo. E não deixa de ser um sintoma bastante significativo das tendências de nossa cultura marcadamente tecnológica e narcótica o fato de havermos interpretado a história de Narciso como um caso de auto-amor e como se ele tivesse imaginado que a imagem refletida fosse a sua própria!
Fisiologicamente, sobram razões para que uma extensão de nós mesmos nos mergulhe num estado de entorpecimento. Pesquisas médicas, como as de Hans Selye e Adolphe Jonas sustentam que todas as extensões de nós mesmos, na doença ou na saúde, não são senão tentativas de manter o equilíbrio. Encaram essa extensão como “auto-amputação” e acham que o dispositivo da estratégia ou da força auto-amputativa é acionado pelo organismo toda vez que a energia perceptiva não consegue localizar ou evitar