Máfia
Don Corleone morreu. O crime organizado dos chefões não existe mais. Ele agora funciona como as grandes empresas: é globalizado, comandado por acionistas e, mais do que nunca, presente na sua vida
por Maurício Horta
Roberto Saviano contou 3 600 pessoas mortas nos últimos 30 anos pela Camorra – a máfia de Nápoles. E, desde que publicou seu livro Gomorra, sobre o grupo criminoso, o jovem escritor de 29 anos tem se escondido para não entrar na lista.
E foi nessa condição que ele viu Gomorra se tornar um best seller mundial. O sucesso, aliás, não é só por a Camorra ser a maior organização criminosa da Europa mas também por ela representar a nova estrutura do crime organizado. Sabe a hierarquia da Cosa Nostra, dos poderosos chefões que mandam em tudo? Ela não tem mais vez. A Camorra cresceu tanto por se organizar numa rede flexível, composta de vários núcleos e aberta a receber mais e mais clãs. O Crime Companhia Limitada virou Crime Sociedade Anônima. Eis a receita das máfias de hoje.
Essa transformação tem a ver com o que aconteceu no mundo no fim do século 20. A URSS ruiu e o liberalismo derrubou fronteiras. As comunicações ficaram mais fáceis. As viagens, mais baratas. O comércio internacional cresceu de US$ 3,7 trilhões em 1993 para US$ 13,6 trilhões em 2007. E o alcance de suas atividades estendeu-se também. Mas com ele também foi globalizada a criminalidade. Nunca o crime organizado atravessou tantas fronteiras nem movimentou tanto dinheiro – 20% da economia mundial, segundo o venezuelano Moisés Naím, ex-diretor do Banco Mundial e autor do livro Ilícito. “Quando um traficante de drogas nepalês opera na Tailândia em nome de grupos nigerianos que refinam um produto em Lagos antes de exportá-lo para os EUA em bagagens de mulheres europeias, é quase certo que alguns dos envolvidos nessa sequência estejam igualmente negociando outros bens – talvez peles de animas exóticos do Sudeste Asiático, cds piratas ou mão-de-obra infantil”, escreve