Metalinguística forense
José Carlos Barbosa Moreira
Em todo setor do conhecimento e da atividade humana forma-se e desenvolve-se uma linguagem particular. É fenômeno inevitável e, em si, perfeitamente natural. Os geômetras dificilmente poderiam entender-se uns com os outros se não dispusessem de palavras como circunferência e poliedro; e o mesmo se dirá dos botânicos, se lhes faltassem vocábulos como líquen e pistilo. Conforme bem se compreende, à medida que aumenta o grau de especialização, vai tomando feitio mais complicado o vocabulário técnico, e com isso a distância entre ele e o comum, com a fatal conseqüência de aumentar igualmente, para os não iniciados, a dificuldade de perceber de que se trata. Alguém não muito versado em biologia poderá ouvir sem arregalar os olhos palavras como epiderme e gástrico, mas com certeza se sentirá perplexo se lhe falarem de carúnculas mirtiformes, ou lhe disserem que determinada substância tem efeito anticolinérgico.
A perplexidade do leigo às vezes se explica pela variação semântica que o vocábulo sofre ao deslocar-se para a língua proficular. Trabalho é palavra familiar mesmo a pessoas de baixo nível cultural; contudo, se a lermos num compêndio de física, aberto ao acaso, corremos o risco de cair em tremendo equívoco, se não nos advertimos de que o significado passou a ser outro, bem diverso daquele a que estamos habituados.
Não seria razoável supor que a fenômenos do gênero houvesse de ficar imune à ciência jurídica. Em direito, como em tudo mais, formam-se palavras e expressões técnicas de feição capaz de assustar quem não haja feito estudos especializados. Que se pode esperar, por exemplo, quando se atiram a ouvidos inexpertos pedradas sonoras da força de "casamento putativo", "mútuo feneratício" ou "embargos infringentes"?
Aqui também não faltam casos em que a identidade formal pode induzir em erro o leitor ou o ouvinte desprevenido. Quem percorra com os olhos o índice