Memórias do subsolo
Falar de racionalismo em "Memórias do Subterrâneo" é analisar o narrador-personagem, o homem do subterrâneo, a partir do seu ponto de vista racional a respeito do mundo e da sociedade que o cerca, ou seja, colocar-se no papel do próprio narrador-personagem, esmiuçando as suas diferentes perspectivas sobre diversos temas, conceitos, ideias/teorías e crenças, é fundamental para desverdar-se o modo de pensar e o por que de pensar de tal maneira do homem do subterrâneo. Percebe-se que o conceito de racionalismo se dá de forma mais forte na primeira parte do romance intitulada "O subterrâneo" pois nela ocorre a teorização das ideias do narrador-personagem. Ele as expõe como se estivesse dialogando com o leitor, supondo suas reações, prevendo seus comentários. O discurso é direto, dono de uma acidez cultivada por anos de auto-flagelamento. É o desabafo de alguém que de tanto remoer em culpa por ser o que é, aprendeu a sentir prazer nisto.
Sou um homem doente... Sou mau. Nada tenho de simpático. Julgo estar do- ente do fígado, embora não o perceba nem saiba ao certo onde reside o meu mal. Não me trato, e nunca me tratei, por muito que considere a medicina e os médicos, pois sou altamente supersticioso, pelo menos o bastante para ter fé na medicina. (Possuo instrução suficiente para não ser supersticioso e, no entanto, o sou...) Não, se não me trato é por pura maldade; é assim mesmo.
(DOSTOIÉVSKI, 2004, p. 665) Assim começa a narração das memórias do homem do subterrâneo; já no início, pontua o seu discurso a partir da provável réplica do outro, sobre a qual irá sempre afirmar a última palavra. Reticências, negativas, evasivas, parênteses,