Maquiavel
Fernando Quintana
Abordar o problema da fundação da ordem política, bem como o de uma ordem capaz de assegurar neste mundo o bem comum, logo de transcorrida a Idade Média, é falar do reino, Principatibus, e da república, Discorsi de Maquiavel. Ou seja, uma situação de anormalidade, silentium legibus - momento extraordinário - e outra de normalidade, boas leis e instituições - momento ordinário. Tais situações, por sua vez, remetendo a dois tipos de virtude: a do príncipe, que toma a forma de “destruição criativa” (Wolin, 2001: 250) e a do povo respeitoso das leis e instituições, que permitem a liberdade (individual e política).
No primeiro caso, estamos diante de um argumento ex parte principis, de cima para baixo, uma visão descendente do poder, que gira em torno da criação e manutenção do estado, no segundo, diante de um argumento ex parte populi, de baixo para cima, uma visão ascendente do poder, que gira em torno dos direitos e deveres do cidadão. Em termos éticos, a virtude de um só, principado, e a virtude de muitos, república: Nos períodos em que a ordem social é relativamente estável, todas as questões morais podem ser colocadas dentro do contexto das normas compartilhadas pela comunidade (república); nos períodos de instabilidade, pelo contrário, as normas mesmas são questionadas e submetidas à prova diante os critérios representados pelas necessidades humanas (principado) (MacIntyre: 1994: 129).
As virtudes pagãs ou mundanas (coragem, honra, etc) assumindo um viés individual ou coletivo: “prefiro salvar minha pátria que a minha alma”1 ou “a república deu mostras de grandeza porque (os cidadãos) amam e defendem a liberdade”, respectivamente2. A presença destes dois tipos de virtudes (fortes) dando lugar ao seguinte comentário de Rousseau: querendo dar lições aos reis, Maquiavel, acabou dando grandes lições aos povos. Avaliação que encontra eco no secretário florentino quando afirma - as repúblicas são melhores