Literatura
Minha Marília, tu enfadada? Que mão ousada perturbar pode a paz sagrada do peito teu?
Porém que muito que irado esteja o teu semblante: também troveja o claro céu.
Eu sei, Marília, que outra pastora a toda hora, em toda a parte, cega namora ao teu pastor.
Há sempre fumo aonde há fogo:
Assim, Marília, há zelos, logo que existe amor.
Olha, Marília, na fonte pura a tua alvura, a tua boca e a compustura das mais feições.
Quem tem teu rosto
Ah! Não receia que terno amante solte a cadeia, quebre os grilhões.
Não anda Laura nestas campinas sem as boninas no seu cabelo, sem peles finas no seu jubão.
Porém que importa?
O rico asseio não dá, Marília, ao rosto feio a perfeição.
Quando apareces na madrugada, mal embrulhada na larga roupa, e desgrenhada, sem fita ou flor,
Ah! Que então brilha a natureza!
Então se mostra tua beleza inda maior.
O céu formoso, quando alumia o sol de dia, ou estrelado, na noite fria, parece bem.
Também tem graça quando amanhece; até Marília, quando anoitece também a tem.
Que tens, Marília, que ela suspire, que ela delire, que corra os vales, que os montes gire, louca de amor?
Ela é que sente esta desdita; e na repulsa mais se acredita o teu pastor.
Quando há, Marília, alguma festa á na floresta,(fala a verdade!) dança com esta o bom Dirceu?
E se ela o busca, vendo buscar-se, não se levanta, não vai sentar-se ao lado teu?
Quando um por outro na rua passa, e ela diz graça ou muda o gesto, esta negaça faz-lhe impressão?
Se está fronteira, e brandamente lhe fita os olhos, não põe, prudente, os seus no chão?
Deixe o ciúme, que te desvela, Marília bela; nunca receies dano daquela que igual não fôr.
Que mais desejas?
Tens lindo aspecto;
Dirceu se alenta de puro afecto, de pundonor.