INTRODU O NO CADERNO
No Brasil, até recentemente, a elite funcional governante sempre dividiu o poder com membros da classe dominante, situados dentro do Estado (sobretudo nos órgãos legislativos), ou fora dele.
Durante o Império, como bem salientou o historiador José Murilo de Carvalho5, entre ambos os grupos estabeleceu-se uma correlação de forças, em razão da qual eles se aliavam ou se confrontavam periodicamente, de modo aberto ou oculto, numa dialética da ambigüidade, sugestiva expressão cunhada pelo sociólogo Guerreiro Ramos. Nem as classes dominantes (os grandes proprietários rurais e os comerciantes de importação e exportação) podiam impor quando quisessem a sua vontade ao Estado – foi o caso da Lei do Ventre Livre, que levou fatalmente ao fim da escravidão –, nem o Estado era livre de agir, como bem entendesse, contra o interesse econômico daquelas, como mostrou a Lei de Terras de 1850.
Na República, o esquema de exercício do poder permaneceu substancialmente inalterado, muito embora as classes dominantes tenham mudado. Foi somente com o advento da globalização capitalista, no final do século XX, que o estamento funcional retirou-se do palco, deixando a cena inteiramente ocupada pelos grandes grupos empresariais. E estes – fato inédito em nossa história – são agora predominantemente estrangeiros. Mais da metade do faturamento industrial do país é feito por empresas estrangeiras. Dos vinte maiores bancos aqui instalados, onze são estrangeiros. Das três maiores redes de supermercados em operação, duas são estrangeiras. Além disso, o Brasil está há mais de dez anos em situação de aguda dependência financeira diante do FMI, organização que, como ninguém ignora, é estatutariamente controlada pelos Estados Unidos. Seria imperdoável ingenuidade imaginar que o governo norte-americano, ou todos esses grupos estrangeiros que aqui se instalaram como sucessores, sócios ou concorrentes do empresariado nacional, não manifestem doravante interesse algum em