Imposturas intelectuais
A expressão "dialética negativà' subverte a tradição. Já em Platão, "dialéticà' procura fazer com que algo positivo se estabeleça por meio do pensamento da negação; mais tarde, a figura de uma negação da negação denominou exatamente isso. O presente livro gostaria de libertar a dialética de tal natureza afirmativa, sem perder nada em determinação. Uma de suas intenções é o desdobramento de seu título paradoxal.
O autor só desenvolve aquilo que, de acordo com a concepção dominante de filosofia, seria o fundamento depois de ter exposto longa e minuciosamente muito do que é assumido por essa concepção como erigido sobre um ~ndamento. Isso implica uma crítica tanto ao conceito de fundamento quanto ao primado do pensamento do conteúdo. Seu movimento só alcança autoconsciência em sua execução.
Ele necessita daquele elemento que seria secundário, segundo as sempre vigentes regras de jogo do espírito.
Mas o que se oferece aqui não é apenas uma metodologia dos trabalhos materiais do autor; de acordo com a teoria da· dialética negativa, não existe nenhuma continuidade entre aqueles trabalhos e este. Não obstante, trataremos dessa descontinuidade e das indicações para o pensamento que podem ser deduzidas dela. O procedimento não é fundamentado, mas justificado. Até onde consegue, o autor coloca as cartas na mesa. O jogo, porém, é certamente outra coisa.
Ao ler, em 1937, a parte da Metacrítica da teoria do conhecimento que o autor tinha então concluído - o último capítulo naquela publicação" -, Benjamin comentou: é preciso atravessar o deserto de gelo da abstração para alcançar
• Adorno se refere nesse caso à obra Zur Metakritik der Erkenntnistheorie. Studien uber Husserl und die phanomenologischen Antinomien (Sobre a metacritica da teoria do conheciment~. Estudos sobre Husser! e as antinomias