Globalização
Globalização – as conseqüencias humanas. RJ: Editora, 1999, p. 16 a 24.
No mundo do pós-guerra espacial, a mobilidade tornou-se o fator de estratificação mais poderoso e mais cobiçado, a matéria de que são feitas e refeitas diariamente as novas hierarquias sociais, políticas, econômicas e culturais em escala cada vez mais mundial. E para aqueles no topo da nova hierarquia, a liberdade de movimento traz vantagens muito além daquelas resumidas na fórmula de Dunlap.
Essa fórmula considera, promove ou rebaixa apenas aqueles competidores que se possam fazer ouvir — aqueles que podem exprimir suas queixas e provavelmente o farão, transformando-as
em
reivindicações.
Mas
há
outras
conexões,
também
localmente limitadas, interrompidas e deixadas para trás, sobre as quais a fórmula de
Dunlap mantém silêncio porque é improvável que se façam ouvir.
A mobilidade adquirida por “pessoas que investem” — aquelas com capital, com o dinheiro necessário para investir — significa uma nova desconexão do poder face a obrigações, com
efeito
uma
desconexão
sem
precedentes
na
sua
radical
incondicionalidade: obrigações com os empregados, mas também com os jovens e fracos, com as gerações futuras e com a auto-reprodução das condições gerais de vida; em suma, liberdade face ao dever de contribuir para a vida cotidiana e a perpetuação da comunidade. Surge uma nova assimetria entre a natureza extraterritorial do poder e a contínua territorialidade da “vida como um todo” -— assimetria que o poder agora desarraigado, capaz de se mudar de repente ou sem aviso, é livre para explorar e abandonar às conseqüências dessa exploração. Livrar-se da responsabilidade pelas conseqüências é o ganho mais cobiçado e ansiado que a nova mobilidade propicia ao capital sem amarras locais, que flutua livremente. Os custos de se arcar com as conseqüências não precisam