Michel Foucault trilhou um longo caminho antes de arquitetar seus pensamentos de 1962, passando por dificuldades de cunho tanto pessoal quanto filosófico. Escreveu “Doença mental e personalidade”- em 1954 - estando sob grande influência marxista, o que explica as mudanças na sua corrente de pensamento, uma vez que o marxismo – e a fenomenologia – são fortemente criticados na versão da obra “Doença mental e psicologia” de 62. A comparação dos textos “Doença mental e personalidade” e “Doença mental e psicologia” ilustra bem a mudança radical sofrida pelas ideias do filósofo. De modo geral, em 54 Foucault está empenhado em descobrir a chamada psicologia real, pretendendo se livrar dos chamados “psicologismos” para fundamentar uma medicina mental com rigor científico, pautada na personalidade do que ele chama de ‘homem real’. Em 62, como diria o professor Thiago Ribas: “Ao invés de propor uma verdadeira psicologia, quer compreender como se construiu historicamente um discurso verdadeiro chamado psicologia”1. Nesse momento Foucault entende que é preciso situar historicamente a doença mental e sua medicina, inclusive na introdução dessa segunda edição ele traça um paralelo entre o homem, o homem louco e o homem verdadeiro, tentando situar esses personagens na história a fim de interpretá-los. Em 62 Foucault não está mais preocupado em extinguir determinados postulados a fim de fundamentar a psicologia real (embora ainda tente desvencilhar-se de certos conceitos ‘metapatológicos’), mas sim de conscientizar-se desses postulados. O crítico literário Pierre Macherey descreve essa conscientização: “Assim, ela jamais poderá libertar-se por completo desses fatores prévios, para aceder ao estatuto objetivo de ciência, mas apenas tomar consciência deles, mediante uma reflexão histórica sobre suas próprias condições de possibilidade.” 2
Já na introdução de ambas as obras é possível citar trechos que demonstram de forma categórica as diferentes intenções de Foucault nesses