Fedro
O discurso de Lísias sobre o amor
“Conheces os meus sentimentos, e como já me ouviste dizer, acredito que nos será proveitosa a realização deste desejo. Confio em que meu pedido não será feito em vão, pois não sou teu amante. Os amantes, de fato, ao saciarem a sua concupiscência arrependem-se das vantagens que ofereceram, ao passo que, para os que não amam,nunca chega o momento em que teriam motivos para o arrependimento. Não foi a força da paixão que os impeliu a fazer o bem, não por necessidade mas voluntariamente, e o fazem com toda a energia, julgando assim servir também aos seus próprios interesses.Os amantes apaixonados levam em conta aquilo que, por causa do amor, os levou a descuidarem de seus negócios; computam os serviços que prestaram, os esforços que envidaram, e assim acreditam ter mostrado aos amados a devida gratidão. Os que não estão sujeitos à paixão não alegam o desleixo dos negócios, nem os esforços despendidos, nem as dissensões para serem agradáveis com os seus amantes. Os apaixonados afirmam ser os melhores amigos daqueles a quem amam e estar prontos para suportar injúrias e sevícias alheias no empenho de lhes prestarem favores; mas facilmente se percebe até que ponto tais protestos são verídicos e até que ponto tais homens devem ser estimados. Quando, mais tarde, se apaixonam por outro, preferem-no ao antigo amado, e é claro que, se aquele o desejar, até se disporão a agir em prejuízo deste. Mas convirá conceder favores tão preciosos a quem padece de tão enorme defeito do qual ninguém poderá libertá-lo? Os próprios amantes confessam que têm doente o espírito e que já não possuem bom senso; dizem ter consciência da sua insensatez mas que são, a um tempo, incapazes de dominar-se. Como poderão tais homens, se chegarem a refletir com sensatez, considerar como um bem o que desejavam nesse estado de delírio? Se tu quisesses escolher o melhor entre teus apaixonados, só muito poucos terias à tua disposição; se quisesses, porém