evolução Política do Brasil - Caio Prado Jr
O Brasil é uma paisagem.
(Nelson Rodrigues)
O meu sentimento nativista [...] sempre se doeu desta adoração da natureza. [...] eu não fiz, nem mandei fazer, o céu e as montanhas, as matas e os rios. Já os achei prontos.
(Machado de Assis)
O motivo edênico habita a imaginação nacional desde os primórdios da presença européia. A visão do país como natureza cristalizou-se definitivamente, e um tanto injustamente, no ufanismo de Afonso Celso. Este artigo tem dois objetivos. O primeiro é documentar, com dados de pesquisa de opinião pública, a surpreendente vitalidade do motivo edênico no Brasil de hoje. O segundo é sugerir que possível explicação do fenômeno pode estar naquilo que poderíamos chamar de motivo satânico, a visão negativa do povo, que também nos persegue de longa data. A razão edênica
A presença do motivo edênico está bem documentada (Holanda, 1959; Cândido, 1981; Ventura, 1991). A visão paradisíaca da terra começou com os primeiros europeus que nela puseram o pé. Ela está presente já na carta de Caminha. Logo depois, em 1503, Américo Vespúcio, na carta que ficou conhecida como Mundus novus, dirigida a Francesco de Medici, declara que, a existir o paraíso terreal, não estaria longe das terras que viu. Entre os cronistas quinhentistas, Gandavo supera Caminha em entusiasmo em sua História da Província de Santa Cruz, de1576. Para ele, "é esta província sem contradição a melhor para a vida do homem que cada uma das outras de América, por ser comumente de bons ares e fertilíssima, e em grã maneira deleitosa e aprazível à vista humana." (Gandavo, 1980, p. 81).1 A província, continua, é revestida de alto e espesso arvoredo e regada com águas de muitas ribeiras, a terra é sempre verde, o clima de permanente primavera: "nunca nela se sente frio nem quentura excessiva" (idem, p. 82). Não seria difícil rastrear afirmações parecidas em outros cronistas do século