Especialista
“Trabalho, obra, ação”1
(Hannah Arendt)
Tradução de Adriano Correia
Revisão de Theresa Calvet de Magalhães
Resumo: Em meados da década de 1960, quando a relevância do pensamento para a moralidade se convertia em uma das preocupações centrais de Hannah Arendt, ela retoma, no texto aqui traduzido, sua inusitada distinção entre as atividades fundamentais do trabalho, da obra e da ação. Partindo da questão “em que consiste uma vida ativa?”, ela revisita e repõe suas análises de A condição humana, ocupando-se novamente com as implicações das inversões hierárquicas entre estas atividades para a vida, para o mundo e, principalmente, para a pluralidade humana. No mesmo sentido, ela examina os princípios que orientam as atividades do animal laborans, do homo faber e do homem de ação, assim como seu significado para a afirmação da liberdade humana e da dignidade da política. Para Hannah Arendt, este é o ponto de partida para pensar sobre o que estamos fazendo.
Durante esta breve hora, eu gostaria de levantar uma questão aparentemente estranha. Minha questão é a seguinte: em que consiste uma vida ativa? O que fazemos quando estamos ativos? Ao propor esta questão, admitirei como válida a antiga distinção entre dois modos de vida, entre uma vita contemplativa e uma vita activa, que encontramos em nossa tradição de pensamento filosófico e religioso até o limiar da era moderna, e que quando falamos de contemplação e ação, nos referimos não apenas a certas faculdades humanas, mas a dois modos de vida distintos. Sem dúvida, a questão possui alguma relevância, porque mesmo se não contestarmos a suposição tradicional de que a contemplação é de
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Arendt, H. Cadernos de Ética e Filosofia Política 7, 2/2005, p. 175-201.
uma ordem superior à ação ou a de que toda ação é efetivamente apenas um meio cujo verdadeiro fim é a contemplação, não podemos duvidar — e ninguém jamais duvidou — de que seja bastante possível para os seres humanos passar pela