Escola Militante
Charles Boxer (contra Gilberto Freyre): raça e racismo no Império Português ou a erudição histórica contra o regime salazarista1
Charles Boxer (against Gilberto Freyre): race and racism in the Portuguese Empire or historical erudition against Salazar’s regime
Albert o Luiz Schne i der
Em 1963, o historiador britânico Charles Boxer (1904-2000) – então professor da Cátedra Camões, do King’s College London – publicou um livro que causou furor no Brasil e, sobretudo, em Portugal. Trata-se de Race relations in the
Portuguese Colonial Empire, 1415-1825. A obra era fruto de três conferências proferidas na Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos, em novembro de
1962: “Morocco and West Africa”, “Moçambique and India” e “Brazil and Mara-
Alberto Luiz Schneider é doutor em História pela Unicamp, com pós-doutorado no King’s College London e no Departamento de História da USP. É professor de História da PUC-SP, São Paulo, Brasil
(alberto.ls@uol.com.br).
Este artigo é parte do pós-doutorado na USP, financiado pela FAPESP.
Artigo recebido em 30 de junho e aprovado para publicação em 10 de setembro de 2013.
Est. Hist., Rio de Janeiro, vol. 26, nº 52, p. 253-273, julho-dezembro de 2013.
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Alberto Luiz Schneider
nhão”. Nesses ensaios, Boxer, um historiador moderado, empirista, distante das teses marxistas em voga na época – e bem relacionado nos círculos intelectuais portugueses – denunciava com rigor histórico e erudição as práticas raciais no
Império Português da Era Moderna.
Já nas primeiras páginas do livro, o autor citava uma entrevista concedida pelo primeiro-ministro de Portugal, António de Oliveira Salazar, à revista britânica Life, na qual este afirmava que os contatos entre os colonizadores portugueses e os povos colonizados “jamais envolveram a menor ideia de superioridade racial ou discriminação” (Boxer, 1967: 35).2 Autor de livros importantes – como The Christian century in Japan, 1549-1650 (1951), Salvador de Sá and