Epistemes
Terceiro caderno (2013)
Discurso sociológico da modernidade
Marcos Lacerda
Cadernos do Sociofilo
INTRODUÇÃO
Num conhecido trecho de “As palavras e as coisas”, Foucault menciona a possibilidade de estarmos vivendo um momento no qual o “homem” desapareceria, o “homem” forjado pela episteme das ciências humanas, tornado objeto e fundamento do conhecimento e do real, “O homem é uma invenção cuja recente data a arqueologia de nosso pensamento mostra facilmente. E talvez o fim próximo”. (Foucault, 2002: 536). A “morte do homem” seria a morte de um conjunto de discursos que se caracteriza pela construção de “sujeições antropológicas”, e a motivação principal do trabalho do arqueólogo seria justamente mostrar o modo como estas sujeições foram sendo construídas para, a partir daí, desfazê-las (Foucault,1986)1. Em “Os fins do homem”, Derrida (1991) mostra como a noção de “realidade humana” constituída pelo existencialismo do Sartre de “O Ser e o Nada” seria uma extensão da metafísica do humanismo clás1Na medida em que o “discurso” em Foucault deve ser compreendido na sua dimensão de “estrutura” e “evento” e, neste sentido, mais como “acontecimento discursivo” no qual a dimensão das práticas discursivas se relaciona com práticas não discursivas, a “morte do homem” deve ser pensada nestas duas dimensões, levando em consideração obviamente que o “homem” de que se fala é uma relação de força historicamente delimitada. Num trecho significativo de
“Conversações”, Deleuze mostra como a noção de “morte do homem” em
Foucault não pode ser considerada nem como a morte dos homens no sentido
“concreto”, nem como apenas a morte do “signo homem”. Não se trata disso, mas sim de “relações de força” nas quais as forças do “homem” se associam com outras “forças” como a “divina”, no período clássico relacionada à “forças de infinito”. No século XIX nasce a forma-Homem, que se caracteriza pela relação das forças do homem com a