Entrevistas com analfabetos
Eu era cega e não sabia, porque quem não conhece as letras é como um cego. Nem sei como conseguia trabalhar na escola. Mas muitas coisas eu não podia fazer sozinha, tinha que ir um filho ou neto junto no banco e até fazer compras, às vezes. Eu tenho um filho que mora fora, quando eu ia visitar ele tinha que ir alguém junto senão eu me perdia, agora não, posso ir sozinha.
Dona Alzira – cozinheira aposentada – 72 anos
Minha família e meus amigos do bairro viram que eu mudei, todo mundo viu, não precisa mais ninguém ir junto me ajudar no banco, agora além de saber ler sei mexer no caixa eletrônico. Depois que aprendi a ler fiz um curso disso, o professor da faculdade veio aqui na sala e ensinou nós. Todo mundo que fez o curso foi num sábado de tarde no banco que recebe e lá tinha gente para ensinar, todos da faculdade ensinando a gente. Antes se ninguém ia junto eu tinha que pedir para estranho... podia até ser bandido... a gente não conhecia. É uma mudança grande, mas é bom porque não é só eu que vejo isso, todo mundo viu que melhorei.
João Maria – auxiliar de produção – 52 anos
Na última eleição fui votar feliz, não precisei mais sujar o dedão. Escrevi meu nome. Sempre levo meu filho mais novo junto, agora ele tem 11 anos e ficou vendo eu escrever meu nome. Depois ele disse: a outra vez que a senhora veio votar teve que por o dedão na tinta preta e nem sabia o que fazer com os botões da máquina. É verdade, mas na última eleição foi diferente, porque não foi só isso, isso de escrever o nome foi importante, mas também aqui na sala a gente falou muito sobre votar bem, sobre não vender o voto, a gente foi com a professora lá na faculdade quando veio uns candidatos pra ver o que eles diziam de bom pra nossa cidade, a gente tem que ser curioso, não é só aprender escrever e pronto, é tanta coisa, não precisa saber tudo, mas precisa saber enxergar as coisas mais