Ensaio sobre a dádiva
Por Lucas Kastrup Rehen
O “Ensaio sobre a Dádiva” de Marcel Mauss ocupa um lugar de destaque na literatura antropológica. Este ensaio, de imensa fecundidade para a formulação de teorias sobre a natureza da vida social foi responsável por inúmeros debates nas Ciências Sociais, ao demonstrar a multiplicidade de aspectos - políticos, sociais, econômicos, religiosos, etc - que estão intimamente ligados aos sistemas de dádivas (trocas materiais vividas sob o signo da espontaneidade).
Mauss formulou a idéia-chave de que a circulação de dons e contra-dons corresponde a um “fato social total”, englobando diversos domínios da vida coletiva. Dessa maneira, aplicou e desenvolveu o conceito sociológico clássico dos “fatos sociais”, apresentado por seu tio e professor Émile Durkheim - considerado um dos pais fundadores da Sociologia juntamente com Karl Marx e Max Weber - ao apontar para a peculiaridade da sociedade como objeto de estudo científico, excluindo uma abordagem unicamente psicológica.
O “Ensaio sobre a Dádiva” surpreende, entre outras coisas, pela riqueza dos detalhes etnográficos acerca da troca de presentes, extraídos inicialmente da Polinésia, Melanésia e do noroeste americano. Em seguida, ampliou seu estudo nos lugares onde tinha acesso aos documentos e onde o trabalho filológico o tornava possível.
O estudo atentou-se para o regime de direito contratual e para o sistema de prestações econômicas entre os diversos subgrupos que compõem as sociedades ditas “primitivas”. As reflexões mais constantes fazem menção às cerimônias do kula trobriandês, presente na obra “Argonautas do Pacífico Ocidental” de Bronislaw Malinowski (1976 [1922]). Este sistema de trocas que consiste na circulação de braceletes e colares ofertados nas ilhas do Pacífico, obedece a regras bastante rígidas de circulação e se estende até a negociação de bens de outras ordens, mulheres e serviços. Além do kula, Mauss