Dois irmãos: diálogos com o presente e o passado
Resumo
Analisa-se aqui o romance Dois irmãos, do escritor Milton Hatoum, focalizando o núcleo familiar de Halim e Zana, imigrantes libaneses radicados em Manaus, cenário do enredo. Fala-se das relações conturbadas entre irmãos e de várias nuanças dessas relações, como o incesto, a rivalidade a rejeição. Resgatam-se as histórias bíblicas que encenam os mesmos desajustes e mostram-se os diálogos da obra com outras de escritores brasileiros que também focalizaram, em suas narrativas, a família e seus conflitos atemporais.
Palavras-chave: Família. Incesto. Rejeição. Rivalidade. Intertextualidade
Considerações iniciais
Dois irmãos, romance publicado em 2001 por Milton Hatoum, tematiza o incesto, a rivalidade, a revolta, o ciúme e as tantas nuanças que desajustam a vida de uma família de imigrantes libaneses residente em Manaus. O seu diálogo com o presente e o passado fez-nos resgatar histórias bíblicas, histórias clássicas e contemporâneas para mostrar que seus temas são tão antigos, como atuais, eternos como a própria impossibilidade de harmonia terrena, o que, do mesmo modo, se evidencia em Relato de um certo oriente, obra também de Hatoum, dada à lume em 1990.
1. A história de Dois Irmãos
O enredo de Dois irmãos, embora cíclico, dá-nos a exata noção de uma temporalidade cronológica. A narrativa é construída tendo como ponto de partida a vida de Halim, uma mascate libanês, que se apaixona por Zana, filha de outro libanês, dono de um restaurante. Os gazais do amigo Abbas são definitivos no processo da conquista e passam a funcionar como uma senha para os momentos de amor fogoso, que não eram raros, nem reservados: “Vi Halim e Zana de pernas para o ar, entregues a lambidas e beijos danados, cenas que eu via quando tinha dez, onze anos e que me divertiam e me assustavam, porque Halim soltava urros e gaitadas, e ela, Zana, com aquela cara de santa no café da manhã, era