divorcio
E DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS*
Jorge Duarte Pinheiro**
Sumário: I. A neutralidade impossível. II. Ideologias matrimoniais. III: A ideologia matrimonial da Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro. IV. Ilusões no Direito da Filiação.
V. Fontes de inspiração da lei portuguesa. VI. Vida Comum sem Coabitação? VII.
Ideologia/ilusão do autor.
I. A neutralidade impossível
1. No campo do Direito da Família e das Crianças, a neutralidade legislativa é impossível. A lei reflecte sempre ideologias, concepções de vida.
Por exemplo, a lei portuguesa, à imagem de tantas outras leis ocidentais, acolheu o princípio da monogamia (como decorre do artigo 1601º, alínea c), do Código Civil e do artigo 247º do Código Penal). No entanto, este elemento tido como essencial da civilização europeia (embora sem referência constitucional explícita) não é incontestado. Como é sabido, o direito de Países islâmicos permite o casamento poligâmico. E, dentro do espaço jurídico da América e da Europa, conhecem-se
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Texto elaborado em 2009, com base na intervenção sob o mesmo título, realizada no âmbito da 3ª Acção de Formação do Conselho Superior da Magistratura, “Divórcio e regulação do exercício das responsabilidades parentais/Nova visão do Direito de Família e das Crianças”, Palmela, 5 de Novembro de 2009. Destina-se a ser publicado na obra Estudos em Homenagem a Carlos Ferreira de Almeida, membro do Conselho.
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Professor associado da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, que publicou os seguintes trabalhos sobre a matéria do regime jurídico e das responsabilidades parentais: O núcleo intangível da comunhão conjugal, Coimbra, Almedina, 2004 (em especial, pp. 614-620 e 636-661), antes da Lei nº
61/2008, de 31 de Outubro; e, já na vigência desta lei, O Direito da Família Contemporâneo, 2ª ed.,
Lisboa, AAFDL, 2009 (em especial, pp. 294-335 e 640-669); O ensino do Direito da Família
Contemporâneo, Lisboa,