COTAS PARA AFRO-DESCENDENTES NA UNIVERSIDADES ADPF 186 E RECURSO EXTRAORDINRIO 597.285/RS A COMPATIBILIDADE DAS COTAS RACIAIS COM A ORDEM INTERNACIONAL E COM A ORDEM CONSTITUCIONAL BRASILEIRA Flvia Piovesan 1. Introduo A tica dos direitos humanos a tica que v no outro um ser merecedor de igual considerao e profundo respeito, dotado do direito de desenvolver as potencialidades humanas, de forma livre, autnoma e plena. a tica orientada pela afirmao da dignidade e pela preveno ao sofrimento humano. Os direitos humanos refletem um construdo axiolgico, a partir de um espao simblico de luta e ao social. No dizer de Joaquin Herrera Flores, compem uma racionalidade de resistncia, na medida em que traduzem processos que abrem e consolidam espaos de luta pela dignidade humana. Ao longo da histria as mais graves violaes aos direitos humanos tiveram como fundamento a dicotomia do eu versus o outro, em que a diversidade era captada como elemento para aniquilar direitos. Vale dizer, a diferena era visibilizada para conceber o outro como um ser menor em dignidade e direitos, ou, em situaes limites, um ser esvaziado mesmo de qualquer dignidade, um ser descartvel, um ser suprfluo, objeto de compra e venda (como na escravido) ou de campos de extermnio (como no nazismo). Nesta direo, merecem destaque as violaes da escravido, do nazismo, do sexismo, do racismo, da homofobia, da xenofobia e de outras prticas de intolerncia. O temor diferena fator que permite compreender a primeira fase de proteo dos direitos humanos, marcada pela tnica da proteo geral e abstrata, com base na igualdade formal -- eis que o legado do nazismo pautou-se na diferena como base para as polticas de extermnio, sob o lema da prevalncia e da superioridade da raa pura ariana e da eliminao das demais. Torna-se, contudo, insuficiente tratar o indivduo de forma genrica, geral e abstrata. Faz-se necessria a especificao do sujeito de direito, que passa a ser