Deus e o diabo na terra do sol - dualidade e contradição no sertão
DEUS E O DIABO NA TERRA DO SOL
DUALIDADE E CONTRADIÇÃO NO SERTÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
ESCOLA DE BELAS ARTES
BELO HORIZONTE, 2009 O filme Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963), de Glauber Rocha, é uma das principais produções do cinema novo brasileiro, iniciado por Rio, 40 graus (1957, Nelson Pereira dos Santos) e marcado por uma drástica ruptura com os padrões estéticos e colonizadores do cinema americano e europeu, bem como por um compromisso com a realidade social brasileira. Num geral, os filmes do cinema novo partem do absurdo, da violência, da fome, da sujeira, da dor, da resistência, da agressividade, em contraposição ao romantismo, ao ritmo rápido e descritivo, ao happy end e aos atores másculos dos filmes americanos ou americanizados[1]. O pressuposto é de que o cinema brasileiro há de ser fiel ao povo e às suas vontades, delírios e necessidades. Deve ser mostrado como ele realmente é: massacrado, miserável, colonizado, mas resistente e potencialmente revolucionário. Deus e o Diabo é exemplar em todos esses sentidos. Um de seus grandes feitos é subverter a lógica tão característica das produções hollywoodianas (e das que as imitam, como O Cangaceiro, de Walter Lima Jr.[2]), de se localizar quem é o bom e quem é o mau da história, o mocinho e o vilão, o certo e o errado. O que Glauber mostra é que existe uma dualidade – contraditória, relativa e dialética – nos fatos, nas pessoas, nas crenças e nas atitudes. O que é Deus para uns, é o Diabo para outros, e vice-versa. O Santo pode ser no fundo um Diabo, o padre pode ser um Diabo, e o assassino pode ser um protetor dos marginalizados. A própria construção técnica do filme joga com essa dualidade: a trilha sonora original de Villa-Lobos (erudita) é mesclada com canções cordelistas populares, estas servindo, ainda, como narradoras. Uma cena barulhenta, com muita gritaria é seguida de uma cena muito