descartes
Breve consideração sobre a estratégia cartesiana para conquistar a certeza da ciência nas Meditationes.1
Juan Adolfo Bonaccini2
Muita gente conhece os textos de Descartes, pelo menos os mais lidos, o Discours de la Méthode, as Meditationes de prima philosophia, os Principia philosophiae, as
Regulae ad directionem ingenii. Mas poucas vezes se atenta para o fato de que um homem de ciência como Descartes esteja preocupado em erigir uma metafísica e fundamentá-la de modo último como a base necessária de todas as ciências. Ignora-se por que um cientista como Descartes crê ser imperioso demonstrar a existência de Deus, a distinção essencial entre corpo (divisível) e a alma (indivisível) e a possibilidade real de um conhecimento certo e indubitável acerca dos corpos e suas relações essenciais. Dois problemas, relacionados entre si, são responsáveis por essa preocupação de Descartes: a condenação e subsequente retratação de Galileu, que despertou o horror cartesiano perante o risco de ser condenado pela Inquisição e pela Ortodoxia da Igreja3, e o desafio cético, em voga depois da tradução de Sexto Empírico por Henri Estienne e sua conhecida reapropriação por
Montaigne e Charron4. Por um lado, Descartes precisa mostrar que não é um herege e que a ciência que está a construir é compatível com os dogmas da Igreja; e mais, que essa ciência deve ser fundada metafisicamente em tais dogmas5. Com isso ele atinge tanto a ortodoxia tradicional, que renega e persegue a nova ciência (por ser incompatível com os dogmas da
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Disponível no endereço eletrônico http://criticanarede.com/hist_descartdeus.html.
Professor do Departamento de Filosofia e Vice-Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFRN. juan@cchla.ufrn.br
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GAUKROGER, Stephen. Descartes: uma biografia intelectual. Rio de Janeiro: EDUERJ/Contraponto,
1999, pp. 358-359.
4
RICKEN, Friedo. Antike Skeptiker. Muenchen: Beck, 1994, pp. 9-10.
5
De