Da divisão social do trabalho
Emile Durkheim
5. SOLIDARIEDADE MECÂNICA* *
O lado de solidariedade social a que corresponde o direito repressivo é aquele cuja ruptura constitui o crime; chamamos com este nome todo ato que, num certo grau, determina contra seu autor aquela reação característica que se denomina pena. Buscar aquele laço corresponde pois a indagar a causa da pena ou, mais exatamente, no que consiste essencialmente o crime.(...) Mas não se define o crime quando se diz que ele consiste numa ofensa aos sentimentos coletivos; porque alguns destes podem ser ofendidos sem que haja crime. Assim, o incesto é objeto de uma aversão geral e no entanto se trata simplesmente de uma ação imoral. O mesmo ocorre com a desonra sexual que a mulher comete fora do casamento, devido ao fato de alienar totalmente sua liberdade nas mãos de outrem, ou aceitar de outrem tal alienação. Os sentimentos coletivos aos quais corresponde o crime devem pois se diferenciar de outros por alguma propriedade distinta: devem ter uma certa intensidade média. Não apenas eles são inscritos em todas as consciências, mas são fortemente gravados. Não é bem o caso das veleidades hesitantes e superficiais, mas de emoções e de tendências profundamente enraizadas em nós. A prova disso é a extrema lentidão com que o direito penal evolui. Não só ele se modifica mais dificilmente que os costumes, mas é a parte do direito positivo mais refratária à mudança. Observe-se, por exemplo, o que fez o legislador desde o começo do século XIX nas diferentes esferas da vida jurídica; as inovações em matéria de direito penal são extremamente raras e restritas, enquanto que uma multiplicidade de disposições inovadoras foram introduzidas no direito civil, no direito comercial, no direito administrativo e constitucional. (...) O conjunto de crenças e de sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade forma um sistema determinado que tem sua vida própria; pode-se chamá-lo de consciência coletiva