Cronica

DOIS OVO NÃO, DOIS OVOS

Sexta-feira, como de costume, aproveitei o intervalo da aula para fazer um lanche. Dona Fátima vende todo tipo de salgado e frequenta a universidade há mais tempo que eu. Um colega que me acompanhava não deixou de perceber quando eu pedi um misto quente com "dois ovo", ele veio com o sermão de que não era certo e até feio um universitário falando "dois ovo". Respondi que só um ovo não mataria o meu desejo.
Ele, porém, fez questão de lembrar da aula de sintaxe a que acabava de assistir, falou que as regras básicas da gramática tem ser respeitadas para evitar os vexames mais gritantes, depois pediu "duas cocadas".
Dona Fátima apenas ria, enquanto preparava o lanche de antigo freguês. Pouco depois chegou o professor Valdinar, doutor em linguística, assíduo freguês de Dona Fátima. Ao ver o ilustre homem, o jovem que me acompanhava engoliu suas cocadas sem mastigar e disse: "Como vai professor, gostei muito da aula de hoje, apesar de perceber uma certa ambiguidade no tema". E o professor, meio esbaforido, respondeu: "Me desculpe Paulo André mas eu tô morrendo de fome, Fátima eu vou levar dois lanches"... − deu pra ouvir um risinho fortuito de meu colega. − "Me prepare ai dois misto quente com dois ovo", disse o professor.
“Falar assim, não é errado, toda e qualquer língua humana viva é, intrinsecamente e inevitavelmente HETEROGÊNEA, ou seja, apresenta variação em todos os seus níveis estruturais (fonológico, morfológico, sintático, lexical) e em todos os seus níveis de uso social (variação regional, social, etária, estilística). Isso é PRECONCEITO LINGUÍSTICO”.