o homem não é somente biológico-cultural. É também uma espécie-indivíduo; o ser humano é de natureza multidimensional. Por outro lado, esse homem, que nossos manuais chamavam homo sapiens é ao mesmo tempo homo demens. Castoriadis disse: “ O homem é esse animal louco cuja loucura inventou a razão”. O fato é que não se pode estabelecer uma fronteira entre o que é sensato e o que é louco. Que é, por exemplo, uma vida sensata? É uma vida na qual se presta muita atenção em não tomar vinho, não comer molhos, não sair, não viajar em avião, não correr nenhum risco para conservá-la o maior tempo possível? Ou é uma vida de consumo, de gozo, de embriaguez, na qual se arrisca perder a vida? Evidentemente, ninguém pode dar resposta a esta perguntaNesse homem que é sapiens e demens, há uma mescla inextrincável, um pensamento duplo: um pensamento que chamaria racional, empírico, técnico, que existe desde a pré-história e é anterior à humanidade (posto que os animais executam atos empíricos, racionais e técnicos), mas que, evidentemente, o homem desenvolveu. Também temos um pensamento simbólico, mitológico, mágico. Vivemos permanentemente em ambos os registros. Não se pode suprimir a parte dos mitos, as aspirações, os sonhos, a fantasia. Todos os que se interessam por psiquismo, pela psicologia humana, sabem que os sonhos, os fantasmas, as loucuras são partes integrantes do ser humano. Não são vãos, superestruturas que se desvanecem, mas sim seu tecido. Como dizia Shakespeare: “Somos feitos da matéria dos sonhos”. Por que esquecer isto? Por que ter sempre opiniões compartimentadas? Por que considerar os seres humanos segundo sua categoria sócio-profissional, seu nível de vida, sua idade, seu sexo, de acordo com questionários de opinião ou documentos de identidade? Cada ser, inclusive o mais vulgar e anônimo, é um verdadeiro cosmos. Não só porque a profusão de interações em seu cérebro seja maior que todas as interações no cosmos, mas também porque leva em si um mundo fabuloso e