Carta De Despedida 2
Quando te vi pela primeira vez me encantava o modo como mexia seu café, tão despreocupadamente. Você mal me olhava. Você realmente não me via. Eu me desfazia em gracejos e tentava parecer confortável. Confortável como fiquei sob o cobertor, naquele fim de tarde frio em que a maresia tentava nos congelar mas nossa pele nos mantinha aquecidos. Demorei a vida inteira pra te perceber sem saber que em um segundo iria te perder. Um segundo que se arrastou dolorosamente cravando suas unhas pelo mofo das paredes. O primeiro beijo que te roubei quando nem sabia o que queria e você o que sentia. Agora as minhas lágrimas se espalham com você pelo vento e se misturam às águas dessa cachoeira. Enquanto sua alma se desprende dos meus dedos, as lembranças teimam, invadem, arrebentam. A primeira vez que te convidei pra sair. Seu sorriso de orelha a orelha, todo estabanado, se apoiando na porta aberta do carro. “Claro!” e eu sorri também. Era difícil não me perder de mim quando te via sorrindo assim, com mil pontos de luz entre os lábios. Eu vi essa luz desaparecendo aos poucos de você. E cada suspiro teu aumentava minha angústia. Eu tentava parecer forte. Você precisava. Você merecia. E quando sentia que ia desmoronar lembrava dos teus braços em volta da minha cintura, me puxando, me provocando, morrendo de rir da minha cara de assustada por te ver tão desinibido, cochichando indecências ao pé do meu ouvido, e eu te beijava como se o mundo fosse somente nosso e lá fora não importasse mais. Eu não sabia que uma tênue linha ligava esse beijo ao último, quando você disse “Adeus” porque não dava mais. Eu te pedi “não, por favor, fica”. E chorando você atravessou aquela porta. Eu jurava que havia outra. Tarde demais eu descobri que naquele dia, quando você saiu do meu apartamento, disse à primeira pessoa que encontrou: “Ela é o amor da minha vida.” Parada aqui eu posso te ver. Entre as águas teu rosto sorri pra mim. Quem acreditaria? Cética como sou, eu mesma me