Brados retumbantes
“(...) esse passado de escravos enterrado em nós (...)”.
Maiakóvski
Introdução
Os longos séculos de dominação colonial no Brasil deixaram o legado de uma tradição autoritária e excludente, presente na estrutura societária e estatal. Considerando a multiplicidade de possibilidades de leitura de Brasil e de entendimento da complexidade de sua construção histórica, bem como tratar-se de terreno pantanoso – onde se dá uma profunda disputa ideológica pela memória e sentido - sentimo-nos desafiados a encontrar um eixo de análise que nos permitisse descortinar os componentes estruturais que conformam nossa matriz histórica violenta, articulandoos com outras concepções institucionalistas introduzidas no país no processo de sua afirmação como Estado-Nação. Para a compreensão deste processo e suas produções, torna-se necessário dar amplitude ao nosso olhar, dirigindo-o para horizontes que transcendam o registro empírico da violência institucional - marca registrada do Estado brasileiro –, possibilitando-nos identificar os componentes estruturais e conjunturais de sua construção histórica e vigência na contemporaneidade. Em outros termos, trata-se aqui de buscar a inteligibilidade da problemática contemporânea de violação dos direitos humanos – no universo de suas tensões – a partir do entendimento do passado e sua herança, do peso de sua presença em nossas instituições, relações e subjetividades. Privilegiamos neste sentido, o que Samet (1993) chama de “construção da brasilidade excludente”, no seu esforço de “(...) resolver o dilema que possibilitou criar (no Brasil) uma nacionalidade sem cidadania, pertencer
1 Artigo publicado na Revista Interfaces de Saberes, Ed. FAFICA, Caruaru (PE), dez/ 2004, p. 121-137.
Uma matriz histórica violenta
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sem exercer”. Segundo o autor, trata-se de um esquema de “longa duração”, sendo: (...) impossível traçar um corte cronológico para um processo que se mostra, apesar dos contextos,