Bacillus cereus
Há 30 anos, a antologia "26 Poetas Hoje" reuniu expoentes da literatura brasileira. A obra provocou bastante burburinho no meio acadêmico nacional ao definir aquele que, mesmo após décadas, ainda pode ser considerado o último rótulo significativo quando se fala em poesia no país: marginal
Por Carlos Juliano Barros
Chacal já tinha tomado três ou quatro batidas de limão, o que certamente contribuiu para deixá-lo menos envergonhado. Parecia bastante empolgado com o movimento de uma feira de artes que ele e alguns amigos organizavam no espaço da livraria Muro, a pedido do próprio dono. As pessoas que perambulavam pela loja localizada em Ipanema, bairro badalado da zona sul do Rio de Janeiro, estavam entretidas com a projeção de um vídeo sobre índios nativos do Brasil. As imagens eram acompanhadas pela reprodução da batucada do Cacique de Ramos, tradicional bloco carnavalesco carioca. Não havia microfone ou qualquer outro aparelho que aumentasse a potência de sua voz. Mesmo assim, Chacal não resistiu à súbita vontade de emendar "Papo de Índio", poema de tom coloquial e dinâmico publicado em 1971, quatro anos antes daquele evento realizado em Ipanema:
"Veio uns ômi de saia preta cheiu di caixinha e pó branco qui eles disserum qui chamava açucri
Aí eles falarum e nós fechamu a cara depois eles arrepetirum e nós fechamu o corpo
Aí eles insistirum e nós comemu eles"
Chacal compara sua atitude à declamação de "O uivo", feita por Allen Ginsberg, em 1956, numa galeria de São Francisco. A performance do poeta norte-americano é considerada um marco para a chamada beat generation, cujos valores revolucionaram o comportamento dos jovens dos Estados Unidos no período do pós-guerra. Em busca de uma vida recheada de emoções e aventuras, eles se atiravam na estrada e atravessavam o país de ponta a ponta, preparados para o que desse e viesse. Esse movimento de contracultura surgido na metade do século 20 conquistou corações e mentes do mundo inteiro. |
Impossível