As Viagens
Olavo Bilac
Índice
Primeira migração
Os fenícios
Israel
Alexandre
César
Os bárbaros
As Cruzadas
As Índias
O Brasil
O Voador
O Pólo
A Morte
A missão de Purna
Sagres
Primeira migração.
Sinto as vezes ferir-me a retina ofuscada
Um sonho: - A Natureza abre as perpétuas fontes;
E, ao dano criador que invade os horizontes,
Vejo a Terra sorrir à primeira alvorada.
Nos mares e nos céus, nas rechãs e nos montes,
A Vida canta, chora, arde, delira, larada.
E arfa a Terra, num parto horrendo, carregada
De monstros, de mamuts e de rinocerontes.
Rude, uma geração de gigantes acorda
Para a conquista. A uivar, do refugio das furnas
A migração primeira, em torvelins, transborda.
E ouço, longe, rodar, nas primitivas eras,
Como uma tempestade entre as sombras noturnas,
O estrupido brutal dessa invasão de feras.
Os fenícios.
Ávida gente, ousada e moça! Ávida gente!
Desse estéril torno, desse areal maninho
Entre o Líbano e o mar da Síria, - que caminho
Busca, turvo de febre, o vosso olhar ardente?
Tiro, do vivo azul do pélago marinho;
Branca, nadando em luz, surge resplandecente...
Na água, aberta em clarões, chocam-se de repente
Os remos. Rangem no ar os velames de linho.
Hiram, com o cetro negro em que ardem pedrarias,
Conta as barcas de cedro, atupidas de fardos
De ouro, púrpura, ônix, sedas e especiarias.
Sus! Ao largo! Melcarte abençoe a partida
Dos que vão de Sídon, de Gebel e de Antardus
Dilatar o comércio e propagar a Vida!
Israel.
Caminhar! caminhar!... O deserto primeiro,
O mar depois... Areia e fogo... Foragida,
A tua raça corre os desastres da vida,
Insultada na pátria e odiada no estrangeiro!
Onde o leite, onde o mel da Terra Prometida?
- A guerra! a ira de Deus! o êxodo! o cativeiro!
E, molhada de pranto, a oscilar de um salgueiro,
A tua harpa, Israel, a tua harpa esquecida!
Sem templo, sem altar, vagas perpetuamente.
E, em torno de Sião, do Líbano ao mar Morto,
Fulge, de monte em monte, o escárnio do Crescente:
E, impassível, Jeová te vê, do céu