Art Nil Castro
G I L B E R T O F R E Y R E : R AÇ A , I D E N T I DA D E
E M O D E R N I DA D E
Nil Castro da Silva
Instituto Rio Branco
Resumo: Onipresente na obra de Gilberto Freyre, na qual recebe tratamento diversificado, o tema da culinária e da alimentação evidencia o projeto científico e o programa político do autor pernambucano, bem como seu pioneirismo e sua importância contemporânea.
Buscando um esforço de síntese e a sondagem de alguns aspectos mais recônditos da obra freyreana, esse artigo pretende demonstrar que subjazem ao tratamento da culinária em
Freyre os temas-chave de raça, identidade e modernidade. A relação e entre nutrição e raça sugere que argumentos baseados na alimentação foram fundamentais para sobrepor ao paradigma racista um culturalista. A relação entre alimentação e identidade evidencia que a culinária brasileira é epítome do caráter mestiço do brasileiro. A relação entre alimentação e modernidade implica que a culinária nacional há de ser defendida das forças descaracterizadoras da modernização.
O povo que chupa o caju, a manga, o cambucá e a jabuticaba, pode falar uma língua com igual pronúncia e o mesmo espírito do povo que sorve o figo, a pera, o damasco e a nêspera? —José de Alencar, Benção paterna, prefácio a Sonhos D’Ouro
I think it could be plausibly argued that changes of diet are more important than changes of dynasty or even of religion.
—George Orwell, The Road to Wigan Pier
Não seria exagero afirmar que o tema da culinária, da gastronomia e da nutrição é, em Gilberto Freyre (1900–1987), onipresente. A preocupação com a culinária se estende desde os artigos publicados por Freyre na década de 1920 no Diário de Pernambuco até suas últimas publicações. Em sua obra mais conhecida, Casa grande e senzala, de 1933, Freyre reservou, em cada capítulo, espaço privilegiado à alimentação. O relevo conferido à comida e às suas implicações sociais sugere que aquilo que é modernamente chamado de