Aquela noite
De fato, não foi. Porém, não foi do jeito que deveria ser. Ao contrário, foi uma noite de algum constrangimento. De rostos sem graça olhando para baixo. De corações que se perguntavam: “Como não pensei nisso antes?”
Era o dia especial para os judeus, o momento de celebrar a Páscoa. Era quando lembravam a grande libertação da terra do Egito, quando Deus desembainhou sua espada contra Faraó e os tirou com mão forte do cativeiro. Diante deles, o Mestre. O clima andava tenso. Os acontecimentos das próximas horas mudariam a rumo da história da humanidade. Eles não tinham percebido isso, mas seria a última páscoa. Aquela refeição seria única na experiência daqueles homens.
Não havia escravos na casa. O espaço tinha sido cedido por um homem desconhecido, para que o grupo celebrasse a páscoa. A mobília pronta, a mesa posta, água, bacia e toalhas. Mas não tinha ninguém para fazer o humilde serviço de um escravo: lavar os pés dos comensais. Todos esperavam o momento em que o Mestre começaria mais um de seus discursos, falando aos corações deles sobre coisas profundas e eternas.
Todos se assentam. A ceia começa. Ninguém se manifesta. De repente, para surpresa de todos, Ele se levanta. Tira a veste de cima, enrola-se numa toalha. Sob os olhares espantados de doze pares de olhos, caminha até uma talha. Derrama água em uma bacia. Chega-se aos pés empoeirados do primeiro discípulo. Curva-se. Mete a mão na água e lava-os. Enxuga com a toalha. Vai para o próximo. O silêncio é palpável. Gostariam de enfiar-se num alçapão e sumir dali.
O silêncio é quebrado, mas antes não