Amor: leituras poéticas (Séc. XV - XVIII)
(Séc. XV – Séc. XVIII)
Cantiga sua partindo-se
Senhora, partem tão tristes meus olhos por vós, meu bem, que nunca tão tristes vistes outros nenhuns por ninguém.
Tão tristes, tão saudosos, tão doentes da partida, tão cansados, tão chorosos, da morte mais desejosos cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes os tristes, tão fora d' esperar bem, que nunca tão tristes vistes outros nenhuns por ninguém.
(João Ruiz de Castelo Branco, meados do sec. XV – antes de 1515, Poesia Portuguesa)
Desarrazoado amor, dentro em meu peito
Desarrazoado amor, dentro em meu peito
Tem guerra com a razão, amor que jaz
E já de muitos dias, manda e faz
Tudo o que quer, a torto e a direito. Não espera razões, tudo é despeito,
Tudo soberba e força, faz, desfaz,
Sem respeito nenhum, e quando em paz
Cuidais que sois, então tudo é desfeito. Doutra parte a razão tempos espia,
Espia ocasiões de tarde em tarde,
Que ajunta o tempo: enfim vem o seu dia. Então não tem lugar certo onde aguarde
Amor; trata traições, que não confia
Nem dos seus. Que farei quando tudo arde?
(Sá de Miranda, 1481 – 1558)
Quando eu, senhora, em vós os olhos ponho
Quando eu, senhora, em vós os olhos ponho e vejo o que não vi nunca, nem cri que houvesse cá, recolhe-se a alma a si e vou tresvaliando, como em sonho.
Isto passado, quando me desponho. e me quero afirmar se foi assim, pasmado e duvidoso do que vi, m'espanto às vezes, outras m'avergonho.
Que, tornando ante vós, senhora, tal, quando m'era mister tant' outr'ajuda, de que me valerei, se alma não vale?
Esperando por ela que me acuda, e não me acode, e está cuidando em al, afronta o coração, a língua é muda.
(Sá de Miranda, 1481 – 1558)
Este retrato vosso é o sinal
Este retrato vosso é o sinal ao longe do que sois, por desamparo destes olhos de cá, porque um tão claro lume não pode ser vista mortal.