Alma Minha
Tão cedo desta vida, descontente,
Repousa lá no Céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste.
Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.
E se vires que pode merecer-te
Algua cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,
Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou
O soneto é constituído por duas quadras e dois tercetos, em metro decassílabo com um esquema rimático ABBA//ABBA//CDC//CDC verificando-se a existência de rima interpolada em A, emparelhada em B e interpolada em CD.
O poeta dirige o seu discurso à mulher amada, que, para sua tristeza, morreu jovem: “Alma minha gentil, que te partiste/ Tão cedo desta vida, descontente,”. Ao longo do soneto, o poeta vai-lhe fazendo alguns pedidos, utilizando frases imperativas, tais como: “repousa lá no céu…”,”não te esqueças daquele amor ardente…” e “roga a Deus…”. Afirma também que está em sofrimento e aponta as razões desta tristeza, que se ligam, essencialmente, à ausência da amada, marcada pela distância entre o céu - local de morada dela: ”repousa lá no Céu” - e a terra, espaço de vida do poeta: “viva eu cá na terra”. Estas referências espaciais surgem associadas aos termos com valor deíctico “cá” e “lá”, que reforçam a relação de afastamento entre os dois amantes. Assim, a solução para o sofrimento do sujeito poético seria a aproximação entre os dois e, por isso, ele pede-lhe que rogue a Deus para o levar rapidamente para junto dela: “Roga a Deus, que teus anos encurtou,/ Que tão cedo de cá me leve a ver-te,/ Quão cedo de meus olhos te levou.”
De notar a utilização constante de eufemismos para a referência quer da morte da amada, quer da do poeta: “partiste tão cedo desta vida”, “Deus, que teus anos encurtou” e “que de cá me leve a ver-te”, o que é uma estratégia de