alma
Debaixo dos olhos tem muito sobressalto
Aqui na testa, quando franze, bem no alto, aparece uma linha feita de desgosto
A boca, que já é muito desajeitada, entorta quando ri, como se uma metade fosse feliz e a outra tivesse vontade de chorar, igual a uma criança enjeitada que quer tudo...
JASÃO — E sempre quis um dente dourado
O que mais?...
ALMA — Depois tem o queixo...
JASÃO — O que é que tem?
ALMA — O queixo não é lá muito feliz também
Acho que ele não está muito bem centrado
Tem uma marca, não chega a ser cicatriz, que faz o rosto ficar mais desamparado
JASÃO — Nariz deixa comigo, está sempre gripado
ALMA — Parece feito a régua, o traço do nariz, apontando pros olhos que eu deixei pro fim
Sabe por quê?...
JASÃO — É o mau-olhado, com certeza
ALMA — Porque seus olhos não têm nada de tristeza nem de sofrimento. Aliás, sofrimento sim, sofrimento bom, que vem de não suportar tanta ansiedade incendiando o coração, tanto desejo represado. Olha, Jasão a gota d’água do seu samba é o seu olhar fervendo, borbulhando, contagiando a gente
Quando a água dos seus olhos transbordar um tanto vai ser mais uma gargalhada do que um pranto e em vez de lágrimas, vai correr aguardente
JASÃO — Meus olhos são assim?...
ALMA — Eu cuido de você
Eu trato de fazer você chorar...
JASÃO — O quê?
ALMA — Você tem que chorar e rir e se entregar
Você não tem o direito de se esconder da felicidade, que ela não aparece todo dia, nem pra qualquer um. Vou cuidar de você, tá?...
JASÃO — Tá, Alma, o que você quiser
ALMA — Então, pra começar, vê se você esquece tudo o que é passado, esquece aquela mulher
JASÃO — Não fala assim...
ALMA — Você está com medo...
JASÃO — Não diz “aquela mulher”, ela foi boa pra mim
ALMA — Você tem medo...
JASÃO — Que medo?...
ALMA — De ser feliz . Viveu com a desgraça, gostou, não está a fim de melhorar. Essa mulher é uma raiz