Alberto caeiro
“(...) lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro – de inventar um poeta bucólico, de espécie complicada, e apresentar-lho, já me não lembro como, em qualquer espécie de realidade. Levei uns dias a elaborar o poeta, mas nada consegui. Num dia em que finalmente desistira – foi em 8 de Março de 1914 – , acerquei-me duma cómoda alta e, tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com o título, “O Guardador de Rebanhos”. E o que se seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o nome de Alberto Caeiro. Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre. Foi essa a sensação imediata que tive. E tanto assim que, escritos que foram esses trinta e tantos poemas, imediatamente peguei noutro papel e escrevi, a fio também, os seis poemas que constituem a “Chuva Oblíqua”, de Fernando Pessoa (...) Aparecido Alberto Caeiro, tratei logo de lhe descobrir – instintiva e subconscientemente – uns discípulos. (...)”
F. Pessoa, Carta sobre a génese dos heterónimos, a Adolfo Casais Monteiro
Características da poesia de Caeiro
Caeiro apresenta-se como um simples “guardador de rebanhos”, que só se importa em ver, de forma objectiva e natural, a realidade com a qual contacta a todo o momento. Daí o seu desejo de integração e comunhão com a Natureza. Considera que “pensar é estar doente dos olhos” ver é conhecer e compreender o mundo, por isso pensa, vendo e ouvindo. “pensar é não compreender”, o que significa que recusa o pensamento metafísico. [Ao anular o pensamento metafísico e ao voltar-se apenas para a visão total perante o mundo, elimina a dor de pensar que afecta Pessoa.] Insiste na “aprendizagem de desaprender”, isto é na necessidade de aprender a não pensar, para se libertar de todos os modelos ideológicos, culturais