O brincar como modelo do m todo de tratamento psicanalitico
Revista Brasileira de Psicanálise · Volume 42, n. 1, 124-136 · 2008
O brincar como modelo do método de tratamento psicanalítico Leopoldo Fulgencio1
Resumo: O autor mostra que o tratamento psicanalítico, do ponto de vista de Winnicott, tem um modelo clínico diferente do modelo freudiano e kleiniano. Esse modelo se torna mais claramente visível caso utilizemos, para compreensão geral das propostas e diferenças entre esses autores, a noção de paradigma tal como a formulou Thomas Kuhn. Ao explicitar as características da matriz paradigmática da psicanálise tradicional, podemos focar a atenção num dos elementos dessa matriz – o que diz respeito ao modelo heurístico para a prática de resolução de problemas (clínicos) na psicanálise – e, analisando a obra de Winnicott, distinguir, de um lado, um método de tratamento que tem na interpretação e no desvelamento dos conflitos inconscientes (referidos à sexualidade e ao complexo de Édipo) o seu guia, e, de outro lado, um modelo clínico psicanalítico que tem o seu telos no brincar, na criatividade e no encontro de si mesmo.
Palavras-chave: método; tratamento; brincar; Winnicott.
Para Winnicott, a atividade de brincar constitui um aspecto universal da natureza humana, ainda que existam pessoas que possam estar profundamente doentes e não conquistem essa capacidade, precisando, então, de tratamento (Winnicott, 1968i, p. 63).2 Ao caracterizar o que deriva da ação de brincar, Winnicott dirá: o brincar facilita o crescimento e, portanto, a saúde; o brincar conduz aos relacionamentos grupais; o brincar pode ser uma forma de comunicação na psicoterapia; finalmente, a psicanálise foi desenvolvida como forma altamente especializada do brincar, a serviço da comunicação consigo mesmo e com os outros (Winnicott, 1968i, p. 63).
Ele afirma, então, algo surpreendente, e diz considerar que o tratamento psíquico, seja pelo método psicanalítico, seja por outros métodos psicoterápicos, “se efetua na sobre1
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