O BOI VELHO
Em uma estância havia dois bois muito mansos que levavam a família Silva para tomar banho de arroio, puxando a carroça. Os bois Dourado e Cabiúna eram adorados pelas crianças, sendo praticamente animais de estimação.
As crianças cresceram e os bois continuaram na fazenda com a mesma função. Certo dia Dourado amanheceu morto, pois tinha sido picado por uma cobra. Cabiúna ficou ao redor do amigo pastando, esperando que ele se levantasse.
A família, vendo o boi magro e velho, resolveu soltá-lo no mato, pois já não podia desempenhar suas funções. O tempo passou e Cabiúna retornou à fazenda, e a família, agora composta por aquelas crianças que tanto haviam brincado com os bois, resolveu matá-lo para vender o couro, a carne e tudo o mais que pudessem.
Há uma cena tocante no momento em que o peão afunda o facão no coração do boi: Cabiúna dirige-se à antiga carroça que puxava e coloca o pescoço nas cordas, como se quisesse levar uma vez mais todos para passear ou achasse que estava sendo punido por estar atrasado para a tarefa.
É um conto que mostra a animalização do homem devido à ganância, de um lado, e a humanização do animal, de outro.
Ao fazer de Blau Nunes o narrador de Contos Gauchescos, Simões Lopes Neto enfrentou um problema que nenhum outro escritor brasileiro até então solucionara: que linguagem utilizar? A norma culta soaria falsa e artificial. O linguajar do peão romperia a convenção literária e se isolaria na forma de expressão de um grupo. Simões Lopes Neto solucionou esse problema da seguinte forma: fez largo uso do léxico e eventualmente da sintaxe próprios da linguagem da campanha, mas submetendo-os a morfologia da norma culta. Assim, ele manteve a “cor local”, própria do regionalismo, sem romper com a tradição literária, fazendo universal também a sua linguagem.