O artista da fome: pequena análise
Em Kafka, tudo é intencional. O que nos resta é tentar entender qual foi sua intenção ao produzir este conto. Numa primeira leitura, vê-se apenas o óbvio, mas, o que há nas entrelinhas? O Jejuador se considerava realmente uma artista. Até um empresário tinha. O papel do empresário, à primeira vista, restringia-se apenas em conseguir contratos para a apresentação do artista da fome, em dar por encerrado o jejum após quarenta dias, isto porque o público começava a rarear, perdendo o interesse. Porém, o Jejuador queria mais. Queria e sabia que podia superar-se, pois seu ofício era a sua razão de viver. E sentia-se incompreendido pelos não-artistas, já que ele era um artista, um jejuador profissional. Inicialmente, sentia imenso prazer em ser observado pelos espectadores atônitos e deslumbrados. Talvez essa fosse a sua força: fazer o que sabia que os outros jamais fariam. Kafka descreve essa dimensão do desejo e do prazer vividos por seu personagem de forma sutil, mas explicitamente. Tanto que, à medida que se vai avançando na leitura, nossa reação vai sendo do absurdo. Mas, para o Jejuador, nossa percepção nos diz que seu ofício era a sua razão de viver. Ele rebelava-se com a pressão do empresário em fazê-lo jejuar por tempo determinado, pois queria dar o máximo de si por aquilo que denominava sua arte, sua profissão. Aparentemente ele era feliz em ser assim. Mas, repetimos, ele queria mais. Quando finalmente consegue atingir seu objetivo, parece perceber, finalmente, a realidade: quando, já prestes a morrer, fala ao inspetor do circo que jamais encontrara alimento algum que o apetecesse, vemos aí que sua vida foi uma insatisfação em todos os sentidos, porque mesmo se achando livre, ele acabou por compreender que essa liberdade fora uma ilusão, já que os homens fazem o que fazem por não poderem evitar o que são. Em contraste, temos a fera que o substitui na jaula e que, mesmo presa, parece sentir-se na plenitude